Dação em Pagamento em Alienação Fiduciária
Trata-se de uma dação em pagamento em que foi possível perceber que a dívida se originou de um contrato de compra e venda com alienação fiduciária, conforme certidão de inteiro teor, em que a devedora “devolve o bem” para a credora. Neste sentido surgiram as seguintes dúvidas:
a) Tendo em vista se tratar de compra e venda com alienação fiduciária, a devedora tinha apenas o seu eventual direito sobre o imóvel, entretanto, na escritura de dação em pagamento, o objeto dado em pagamento fora o imóvel. Assim, conforme §8º., art. 26 da Lei 9.514/97, a escritura de dação em pagamento deveria ser alterada para constar como objeto de pagamento o eventual direito sobre o imóvel?
Art. 26 (…)
§8o O fiduciante pode, com a anuência do fiduciário, dar seu direito eventual ao imóvel em pagamento da dívida, dispensados os procedimentos previstos no art. 27.
b) Ademais, na escritura de dação em pagamento não fora mencionada a autorização da credora para o cancelamento da alienação. Entretanto, pelo instituto da confusão, no Código Civil, poderíamos efetuar o cancelamento na matrícula a ser aberta nesta serventia ou pediríamos a alteração da escritura para constar de forma expressa referida autorização?
Resposta:
- O parágrafo 8º do artigo 26 da Lei 9.514/97 menciona dar o seu direito eventual ao imóvel em pagamento da dívida (total);
- No título há menção de ((…) dá em pagamento o referido imóvel em garantia a empresa ORA (….), O imóvel é dado em pagamento pelo valor originário do contrato no importe de R$ 65.884,46 (…)
- O fiduciante não pode ser prejudicado se não for eficaz a dação, e como mencionado no § 8º do artigo 26, da Lei (em pagamento da dívida, diga-se total);
- Portanto, no caso a quitação seria requisito da escritura, o que poderia ser feito (a quitação) também em documento separado (com firma reconhecida), mas a quitação será necessária;
- Já a alienação fiduciária será cancelada pela confusão (artigo 381 do CC).
É o que entendemos passível censura.
São Paulo, 27 de Agosto de 2.020.
Ver processo de nº 114972.55.8.26.0100 da 1ª VRP da Capital do Estado de São Paulo.
DJE DE 14-04-2020. DAÇÃO EM PAGAMENTO NEC. CND’S , E ANUÊNCIA DA FIDUCIÁRIA VISTO QUE FIGURA COMO TRANSMITENTE APENAS A DEVEDORA FIDUCIANTE. MANDADO JUDICIAL . CND’S AFATADA
Processo 1124972-55.2019.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – 10º Oficial de Registro de Imóveis da Capital – Correias Mercúrio S/A Industria e Comércio – Vistos. Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Correias Mercúrio S/A Industria e Comércio, diante da negativa em se proceder ao registro da dação em pagamento do imóvel, objeto da matrícula nº 125.430, em razão do acordo homologado pelo MMº Juízo da 6ª Vara Cível da Comarca de Jundiaí. Os óbices registrários referem-se: a) apresentação de prova da regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional, nos termos do artigo 47, I, alínea “b” da Lei nº 8.212/91; b) adequação do objeto da dação em pagamento ou apresentação da anuência da credora fiduciária, tendo em vista que a transmitente figura apenas como titular de direitos de fiduciante. Juntou documentos às fls.05/58. A suscitada apresentou impugnação às fls. 66/68. Assevera que a transação não foi resultado de um compra e venda normal, mas sim para quitação de débito judicial, razão pela qual o instrumento hábil para oregistro da transação é o mandado judicial expedido pelo MMº Juízo da 6ª Vara Cível da Comarca de Jundiaí, o que dispensa outras exigências. Por fim, afirma que o documento de posição financeira apresentado pela credora na ação judicial caracteriza confissão expressa do procurador. Apresentou documentos às fls.69/96. O Ministério Público opinou pela parcial procedência da dúvida, com o afastamento apenas do primeiro óbice (fls.108/109).
É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
Pretende a empresa Correias Mercúrio S/A Industria e Comércio o registro da da dação em pagamento do imóvel objeto da matrícula nº 125.430. Em relação ao primeiro óbice, referente à necessidade de apresentação de prova da regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional, nos termos do artigo 47, I, alínea “b” da Lei nº 8.212/91, verifico que é mister seu afastamento. Apesar do entendimento pessoal desta magistrada, no sentido de não ser possível declarar, em sede administrativa, a inconstitucionalidade dos dispositivos legais que exigem a apresentação da CND perante o registro imobiliário, reconheço ter sido pacificado o entendimento de qual exigência não pode ser feita pelo Oficial. Neste sentido, além dos precedentes do E. Conselho Superior da Magistratura e da Corregedoria Geral da Justiça deste Tribunal, o Conselho Nacional de Justiça, nos autos do pedido de providências nº 00012308-82.2015.2.00.0000, formulado pela União/AGU, entendeu não haver irregularidade na dispensa, por ato normativo, da apresentação de certidão negativa para registro de título no Registro de Imóveis: “CNJ: Pedido de Providências Provimento do TJ-RJ que determinou aos cartórios de registro de imóveis que deixem de exigir a certidão negativa de débito previdenciária (CND) Pedido formulado pela UNIÃO/AGU para a suspensão cautelar e definitiva dos efeitos do Provimento n. 41/2013, além da instauração de reclamação disciplinar contra os magistrados que participaram da concepção e realização do ato e ainda, que o CNJ expeça resolução ou recomendação vedando a todos os órgãos do Poder Judiciário a expedição de normas de conteúdo semelhante ao editado pela requerida ProvimentoCGJ41/2013editado pelo TJRJ está de acordo com a interpretação jurisprudencial do STF Ressalte-se que não houve qualquer declaração de inconstitucionalidade dos artigos 47 e 48 da Lei n. 8.212/91, mas sim fixação de norma de competência da Corregedoria Geral de Justiça local para regulamentar as atividades de serventias extrajudiciais vinculadas ao Tribunal de Justiça Pedido de providências improcedente” De acordo com o Acórdão: “… Ao contrário do que afirma a Advocacia-Geral da União, verifica-se queo Provimento CGJ n. 41/2013editado pelo TJRJ está de acordo com a interpretação jurisprudencial do STF acerca da aplicabilidade dos artigos 47 e 48 da Lei n. 8.212/91ao dispensar a exigência de apresentação deCNDpara o registro de imóveis. Confira-se: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO TRIBUTÁRIO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CLÁUSULA DA RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL PLENO DO STF. RESTRIÇÕES IMPOSTAS PELO ESTADO. LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL. MEIO DE COBRANÇA INDIRETA DE TRIBUTOS. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte, agora reafirmada em sede de repercussão geral, entende que é desnecessária a submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em Súmula deste Tribunal, nos termos dos arts. 97 da Constituição Federal, e 481, parágrafo único, do CPC. 2. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente entendido que é inconstitucional restrição imposta pelo Estado ao livre exercício de atividade econômica ou profissional, quanto aquelas forem utilizadas como meio de cobrança indireta de tributos. 3. Agravo nos próprios autos conhecido para negar seguimento ao recurso extraordinário, reconhecida a inconstitucionalidade, incidental e com os efeitos da repercussão geral, do inciso III do §1º do artigo 219 da Lei 6.763/75do Estado de Minas Gerais. (ARE 914045RG, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgado em 15/10/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL MÉRITO DJe-232 DIVULG 18-11-2015 PUBLIC 19-11-2015) “119.1. Com exceção do recolhimento do imposto de transmissão e prova de recolhimento do laudêmio, quando devidos, nenhuma exigência relativa à quitação de débitos para com a Fazenda Pública, inclusive quitação de débitos previdenciários, fará o oficial, para o registro de títulos particulares, notariais ou judiciais” Deste modo, existindo norma expressa no sentido de que os Oficiais não podem exigir, para registro de título, qualquer documento relativo à débitos para com a Fazenda Pública, a exigência ora apresentada deve ser afastada. Todavia em relação ao segundo óbice, referente à adequação do objeto da dação em pagamento ou apresentação da anuência da credora fiduciária, não assiste razão à suscitada. Apesar de constar da manifestação da Cyrela Empreendimentos Imobiliários a quitação das parcelas relacionadas ao imóvel, não houve a juntada de qualquer termo de quitação ou anuência expressa da credora fiduciária, sendo certo que o documento juntado às fls.94/95 não constitui título hábil a comprovar a quitação mencionada, não constando qualquer assinatura, tratandose de mero extrato da situação financeira. Logo, deverá a suscitada apresentar a declaração de anuência da credora ou o termo de quitação das parcelas. Diante do exposto, julgo parcialmente procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Correias Mercúrio S/A Industria e Comércio, afastando apenas o primeiro óbice referente à necessidade de apresentação de prova da regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: ALAURI CELSO DA SILVA (OAB 75071/SP)