União Estável – “Bigamia”

Têm ocorrido alguns casos em nosso Registro de Títulos e Documentos, um deles trata-se do seguinte:

Dá entrada em Declaração da Convivência em União Estável em cujo documento consta que Fulano de Tal e Sicrana de Tal convivem juntos por determinado tempo, situação duradoura, sob o mesmo teto, objetivando constituir família, etc.

O funcionário encarregado faz buscas em nossos indicadores, pelos nomes e CPFs e, eventualmente, encontra registro anterior em que, por exemplo, Sicrana de Tal aparece como parte em uma outra Declaração de Convivência em União Estável com terceira pessoa, registro ainda em aberto e sem qualquer averbação de dissolução daquela união.

Esse funcionário faz Nota Devolutiva dizendo que essa nova declaração não pode ser registrada pois já existe uma outra registrada anteriormente envolvendo a mesma pessoa interessada, Sicrana de tal. Sugere, verbalmente, no atendimento no balcão, que os interessados apresentem a Declaração de Dissolução de União Estável para que se possa registrar essa nova.

Em nosso Cartório há quem entenda que não é o caso de estarmos “fiscalizando” esse tipo de comportamento; que essa questão de “bigamia” não é de nossa competência averiguar; que eventuais conflitos entre tais envolvidos seriam questões a se discutir judicialmente, não aqui. Enfim, este entendimento interno de querer registrar essa nova Declaração, ainda com a anterior com seu registro ativo, alega que não gera conflito ou responsabilidade do Cartório de RTD; eventuais interessados que procurem seus direitos em juízo.

Afinal, devemos ou não cuidar desses detalhes quando dos próximos registros desse tipo de Declaração?

Resposta:

  1. O registro da União Estável é facultativo (não obrigatório), na medida em que a união estável não depende de contrato e de registro para existir e para ser dissolvida (artigos 1º e 7º  do Provimento de nº 37/14 do CNJ);
  2. Conforme APC  de nº 1101111-45.2016.8.26.0100 do CSMSP e da 1ª VRP da Capital de nº 1044002-05.2018.8.26.0100 com decisão do CSMSP com o mesmo nº, não há propriamente dito a exigência  do registro da União Estável;
  3. Entretanto é possível o seu registro tanto em RTD, como no Registro de Imóveis e no Registro Civil de Pessoas Naturais;
  4. Entretanto não podem coexistir uniões estáveis paralelas, ou seja, havendo uma união estável (anterior) registrada em RTD, não poderá haver outra a ser registrada em segundo lugar, figurando um dos companheiros da primeira já registrada anteriormente, sem que haja previamente a dissolução da primeira  união estável  averbada no RTD para que possa ser registrada a segunda união estável, de um dos conviventes;
  5. É da mesma forma como a regras que se aplicam ao casamento artigo 1.521, VI do CC e artigo 1.723, § 1º do mesmo código;
  6. Por analogia também poderá ser aplicado o artigo de nº 115 caput da LRP.

Sub censura.

São Paulo, 06 de Novembro de 2.022.

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002

  Art. 1.521. Não podem casar:

VI – as pessoas casadas;

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1 A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521 ; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.

LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973.

Art. 115. Não poderão ser registrados os atos constitutivos de pessoas jurídicas, quando o seu objeto ou circunstâncias relevantes indiquem destino ou atividades ilícitos ou contrários, nocivos ou perigosos ao bem público, à segurança do Estado e da coletividade, à ordem pública ou social, à moral e aos bons costumes.                     (Renumerado do art. 116 pela Lei nº 6.216, de 1975).

Parágrafo único. Ocorrendo qualquer dos motivos previstos neste artigo, o oficial do registro, de ofício ou por provocação de qualquer autoridade, sobrestará no processo de registro e suscitará dúvida para o Juiz, que a decidirá.

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