Transferência de Lote Para Condomínio – Confusão de Diferenças Legais

Recebemos uma sentença contendo ordem para a proprietária e loteadora transferir um lote de terreno (onde estaria situada uma área de lazer/portaria) para o CONDOMÍNIO XYZ.

Dito condomínio foi registro no Livro 3, em 2007, mesmo o empreendimento tendo sido registrado, no Livro 2, como LOTEAMENTO.

Em outras palavras, na matrícula do empreendimento, trata-se de um Loteamento, porém fizeram o registro de uma convenção de condomínio no livro 3 e o juiz deferiu a transferência do imóvel de um lote, do loteamento, para o condomínio, sendo que tal lote seria onde estaria alguma suposta área de lazer/portaria do loteamento/condomínio.

Nesse contexto, considerando que o condomínio foi registrado, no livro 3, entendemos que seria possível ele adquirir o imóvel, mediante autorização/ordem judicial, como a que consta na sentença, ora apresentada.

Nesse contexto, temos as seguintes dúvidas:

1. No novo Código de Normas de Pernambuco constam os dois artigos abaixo transcritos, sendo que o art. 341 está numa seção que se refere à Escritura Pública de Doação e o art. 1469 esta em uma seção que se refere ao Memorial de Incorporação das incorporações imobiliárias:

Seção VIII
Da Escritura de Doação

Art. 341. O condomínio edilício representado por síndico, poderá figurar como adquirente ou dominante na escritura pública em que o objeto for o imóvel contíguo ao seu, adquirido para integrar seu patrimônio, devendo haver a menção expressa na escritura nesse sentido.

Seção II
Do Memorial de Incorporação

Art. 1469. É admissível o registro de escritura pública de compra e venda de unidade autônoma em que figure o Condomínio como adquirente, em decorrência do leilão a que se refere o art. 63, da Lei nº 4.591/1964 ou em razão de decisão judicial
.


O presente caso, porém, versa sobre aquisição de terreno integrante de loteamento que se porta, factualmente, como se condomínio fosse, sendo que, embora seja loteamento, teve sua Convenção de Condomínio registrada no Livro 3 do antigo Registro Geral de Imóveis, ou seja, a título de comparação, o lote a ser adquirido estaria mais próximo da situação narrada no art. 1469 (estaria mais próximo da aquisição de uma unidade autônoma integrante do próprio empreendimento) do que da situação narrada no art. 341 (que versa sobre a aquisição de terreno contíguo ao empreendimento, através de doação), ambos os artigos do novo Código de Normas de Pernambuco.

Nesse contexto

(a) Podemos aceitar a decisão judicial, constante da sentença, como ordem/autorização judicial apta a permitir o registro da aquisição pelo condomínio, seja através de Escritura Pública de Compra e Venda ou Doação, a serem lavradas, seja através de uma Carta de Sentença, caso o réu se negue a realizar a transferência por compra e venda ou doação?

(b) Poderíamos aceitar a decisão constante da sentença apenas com base no art. 1469, por aplicação analógica; ou existem julgados e/ou doutrina que autorizam a aquisição pelo condomínio, independentemente de base legal expressa e específica?

(c) Seria possível, também por analogia, aplicar o disposto no art. 341 do novo Código de Normas de Pernambuco, de modo a permitir a aquisição pelo “condomínio”, independentemente de autorização judicial e na modalidade de compra e venda ou doação, desde que consignada na escritura que a aquisição do imóvel é para integrar o condomínio?

2. Qual deve ser a prova de representação do condomínio, registrado no Livro 3 do Cartório de Imóveis? O condomínio edilício é registrado, além do livro 3 do registro de imóveis, em algum outro ente, seja Junta Comercial, seja Registro Civil de Pessoas Jurídicas, de modo a termos que pedir certidão de algum outro ente?
 

Resposta: Seguem considerações:

  1. O condomínio (edilício – não há em loteamentos/desmembramentos (Lei 6.766/79), há o condomínio edilício;
  2. Entretanto o condomínio não tem personalidade jurídica, mas personalidade judiciária (de estar em Juízo) e não pode adquirir salvo nas exceções do artigo 63 da Lei 4.591/64, no caso de aquisição de imóvel contiguo (adjacente, próximo, vizinho) e com a consequente alteração da incorporação/especificação e convenção, alterando-se a área (do terreno), que com a alteração passara automaticamente para os proprietários das unidades, ou por decisão ou determinação judicial;
  3. A situação apresentada não se encaixa no caso do artigo 63 da lei 4.591/64 nem em aquisição de imóvel contíguo, pois não é condomínio edilício, e não estaria adquirindo terreno contiguo (adjacente, próximo, vizinho) pois o lote está dentro do loteamento;
  4. Em relação a decisão judicial a sentença apresentada às fls. 4 houve a condenação a provida, para a transferência   do lote 21 da quadra G do loteamento Condomínio XYZ em favor do autor (condomínio) através de escritura pública;
  5. Transferir é uma coisa registrar é outra, até transferir por escritura pública entendo ser viável, com observância e ciência das partes. Mas quando ao registro, entendo não ser possível, pois não se enquadra nos casos do artigo 63 citado, nem em aquisição de imóvel contiguo. Careceria de decisão judicial específica com determinação ou autorização do registro, para que esse fosse justificado;
  6. O condomínio é um ente despersonalizado, a convenção tem caráter predominantemente estatutário e convencional;
  7. Não veio o trânsito em julgado da sentença;
  8. No caso o ente nem chega a ser condomínio, não o é porque em loteamento não há essa figura jurídica, somente nos condomínio edilício, e mesmo assim, sem personalidade jurídica, tem o CNPJ, por obrigações fiscais, contábeis.
  9. No caso, repito tem que haver autorização judicial ou determinação também judicial, sob penha de crime de desobediência e/ou multa diária, que se for esse o caso constará do registro que se fará;
  10. Outra solução também poderá ser resolvida através de procedimento de dúvida;
  11. Quesitos:
  1. Não, porque não há nem uma autorização ou determinação judicial, se fosse o caso poderia ser escritura de venda e compra, doação, ou carta de sentença. Ademais não existe o condomínio, por não ser condomínio edilício, em loteamentos não existe essa figura, e se considerar existente no mínimo será irregular;
  2. Sim, e não . Não se pode considerar condomínio, e nem o artigo 63 citado. E sim, se houver autorização e/ou determinação judicial;
  3. Não porque não é condomínio,  e o terreno  não é contiguo, está dentro do loteamento, só se houver autorização e/ou determinação judicial;
  4. Também poderá ser resolvido por procedimento de dúvida;
  5. A prova de representação não há propriamente dito, porque não há síndico, possivelmente a convenção pode dizer algo, assim deve ser solicitada com as alterações se ocorrida. Via de regra , são representados ativa e passivamente em juízo pelo síndico (artigo 75 do CPC).
  6. Finalizando, no caso não há área de uso comum, pois loteamento e não condomínio edilício.

Estas são as considerações que fazemos sub censura.

São Paulo, 17 de Abril de 2.024.

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