Desafetação De Área Pública – Município Loteando e Abrindo Vias Públicas Novas

Estou analisando um desmembramento/retificação de área envolvendo a reconfiguração de uma área comunitária pertencente ao Município, e surgiram duas dúvidas técnicas que gostaria de submeter à sua apreciação:

1.      Desafetação de área pública e implantação de vias

Trata-se de uma área afetada ao município (comunitária), que será retificada e, posteriormente, desmembrada. No processo de desmembramento, a área será subdividida em três porções e seccionada por duas avenidas públicas que serão inseridas na nova configuração territorial. Nesse contexto, pergunto:

É necessária a prévia desafetação dessa área para viabilizar a abertura das vias públicas, ou o município pode realizar esse reordenamento diretamente, considerando que se trata de área pública e que as novas avenidas também terão destinação pública?

2.      Dispensa de anuência dos confrontantes em retificação promovida pelo município

Sabemos que, em regra, a retificação de área exige a anuência dos confrontantes, especialmente quando há alteração nos limites. No entanto, neste caso, a retificação está sendo promovida diretamente pelo município. Assim, pergunto:

Há respaldo jurídico – seja legal, doutrinário ou jurisprudencial – que permita a dispensa da anuência dos confrontantes quando a retificação é promovida por órgão público para fins de correção técnica ou reorganização urbanística?

Agradeço desde já sua atenção e colaboração.

Resposta:

  1. Conforme artigo 99 do Código Civil: ‘os bens públicos são considerados I- de uso como do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças, II -os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias e III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.’
  2. Como a área comunitária (bem de uso especial) está precariamente descrita, precisará ser objeto de prévia retificação judicialmente ou extrajudicialmente nos termos dos artigos 212 e 213 da Lei de Registros Públicos, e em procedimento normal pelos artigos citados com a anuência dos confrontantes e todo o conjunto de regras em que não há dispensa ou respaldo jurídico, legal, doutrinário ou jurisprudencial alguma, inclusive quanto a anuência dos confrontantes;
  3. Com o loteamento/desmembramento (que também deve seguir o procedimento da Lei 6.766/79) temos os equipamentos públicos que são os urbanos e os comunitários. Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede telefônica, gás canalizado, vias de circulação (artigo 5º, parágrafo único e artigo 2°, parágrafo 5º da Lei 6.766/79);
  4. Já a definição de equipamentos comunitários encontra-se do artigo 4º parágrafo 2º da Lei do Parcelamento do Solo. Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação, cultura lazer e similares;
  5. Desta forma estas áreas comunitárias são consideradas bens de uso especial (Artigo 99, II do Código Civil).
  6. As vias públicas (Avenida A e Travessa B) são consideradas de uso comum do povo, as demais (AF., AF.1 e AF.2) bens dominicais, ou patrimoniais;
  7. A área comunitária será desmembrada em três partes AF. AF. l e AF.2 , ao que parece a Gleba AF será uma área remanescente a AF. 1 será futuramente desmembrada em 20 lotes e a Gleba F.2 não sabemos  que destinação terá. Entretanto, possivelmente ficarão as três como bens dominicais, ou dominiais, ou patrimoniais pertences ao município, que poderá – após a desafetação – serem onerados ou alienados livremente. Além disso haverá o desmembramento de duas vias públicas Avenida A e Travessa B, que serão bens de uso comum do povo. Portanto estes bens que mudarão de categorias, de bem de uso especial para bem de uso comum do povo (Avenida e Travessa), e os demais AF, AF.1 e AF. 2 como bens dominiais ou patrimoniais. E assim precisam, após a retificação, ser desafetados por Lei Municipal com aprovação pela Câmara Municipal, e não por decreto ou outro instrumento legal.
  8. Feito isso a gleba AF.1 que será objeto de parcelamento (do solo)  deverá atender a todos os trâmites legais (aprovação pela municipalidade, órgão estadual, e registro em cartório como loteamento nos termos do artigo 2º parágrafo 1º da Lei 6.766/79). E isso porque houve, mesmo que indiretamente, abertura de vias de circulação (Travessa e Avenida) para acesso ao loteamento através das outras avenidas já existentes, ou seja, implicou em abertura de novas vias de circulação.

Era o que sub censura cumpria-me informar.

São Paulo, 15 de Abril de 2.025.

OBS//

Em nosso estado os loteamentos realizados pelo município tem dispensa de alguns itens do artigo 18 da Lei 6.766/79, (item 165.7 do Capitulo XX das NSCGJSP). Portanto será necessário verificar se no código de norma de seu estado há disposição igual ou semelhante.

165.7. Os loteamentos ou desmembramentos requeridos pela União, Estado, Municípios, CDHU, COAHBS e assemelhados estão sujeitos ao processo do registro especial, dispensando-se, porém, os documentos mencionados nos incisos II, III, IV e VII, do art. 18, da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, que forem incompatíveis com a natureza pública do empreendimento.

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002

 Art. 99. São bens públicos:

I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

LEI No 6.766, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1979

Art. 2o. O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes.

§ 1o Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.

§ 2o Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.

§ 5o  A infra-estrutura básica dos parcelamentos é constituída pelos equipamentos urbanos de escoamento das águas pluviais, iluminação pública, esgotamento sanitário, abastecimento de água potável, energia elétrica pública e domiciliar e vias de circulação.          (Redação dada pela Lei nº 11.445, de 2007).       (Vigência)

Art. 4o. Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:

§ 2o – Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação, cultura, saúde, lazer e similares.

Art. 5o. O Poder Público competente poderá complementarmente exigir, em cada loteamento, a reserva de faixa non aedificandi destinada a equipamentos urbanos.

Parágrafo único – Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de abastecimento de água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *