Requisitos Legais da Procuração Para Alienação de Bens Imóveis
Foi apresentada uma procuração para venda de um imóvel situado aqui nossa Comarca. O outorgante confere “poderes específicos para: 1)- com relação a bens imóveis em qualquer município da República Federativa do Brasil, especialmente, mas não se limitando, aos municípios de Nossa Comarca –SP- e São Paulo –SP-, comprar, vender, ceder…….”
O artigo 661 do Código Civil prevê que o mandato em termos gerais só confere poderes de administração e o parágrafo 1º deixa assentado que para alienar depende de procuração de poderes especiais e expressos. Vários doutrinadores asseveram que a outorga de poderes para venda de todos os bens do mandante não supre as exigência legal se eles não são INDIVIDUALIZADOS.
A procuração foi lavrada em 19 de janeiro de 2018 em São Paulo –Capital- (ampla e geral).
Diante do exposto, a princípio, tenho dúvida em utilizar o mandato.
Resposta:
- A procuração deve ser realizada nos termos do artigo 661 e seu parágrafo 1º do Código Civil, (com poderes especiais e expressos);
- Como ela foi lavrada há mais de sete anos, deverá ser apresenta certidão que não poderá exceder o prazo de noventa dias, enfim deve ser apresentada uma certidão atualizada que não exceda o prazo de noventa dias. (Itens 15, alínea “e” e 42, alínea “c” do capítulo XVI das NSCGJSP. Até mesmo para verificação de se não foi revogada pelo mandante).
- Quanto à descrição completa do(s) imóvel(eis), é necessária. No entanto, nesse caso, tal exigência poderá ser mitigada principalmente se o (s) imóvel (eis) for (em) urbano ou rural (ais) georreferenciado (s) (Lei 7433/85 – urbano) e subitem 60. a.1 do Capitulo XVI das NSCGJSP – rural georreferenciado). Caso não se enquadre em uma das duas possibilidades, se assim entender o Senhor Oficial, também poderá ser mitigado, desde que conste o número e local do registros, e pequena referência ao (s) imóvel (eis) juntando-se com os documentos certidão da (s) matrícula (s) ou transcrição (ões) do (s) imóvel (eis), por analogia ao artigo 20, parágrafo 3º do Decreto 167/67;
- De toda sorte em que pese o subitem 131.1 do Capitulo XVI das NSCGJSP, e entendimentos em contrário, entendo s.m.j. que os imóveis a serem alienados devem ser determinados, particularizados, individualizados, até mesmo para maior segurança jurídica;
- Nesse sentido ver: decisões da 1ª VRP – Capital de nº 1051985.79.2.023.8.0100, da 2ª VRP – Capital de nº 1097451.04.2020.8.26.0100, Recurso Especial nº 1.814.643 – SP (2017/0278653-3), resposta do Irib – protocolo 18.591, Aglnt no Recurso Especial nº 2038444- MT (2022/0294958-5) RDI do Irib de nº 89 (Julho/Dezembro – 2.020 páginas 75 a 93.
Sub censura.
São Paulo, 14 de Abril de 2.025.
LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002
Art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de administração.
§ 1o Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos.
Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo
CAPÍTULO XVI
DO TABELIONATO DE NOTAS
SEÇÃO I
DO TABELIÃO DE NOTAS
Dos Arquivos, Pastas e Classificadores
15. O Tabelião de Notas manterá arquivos para os seguintes documentos necessários à lavratura dos atos notariais, em papel, microfilme ou documento eletrônico:
e) traslados de procurações, de substabelecimentos de procurações outorgados em notas públicas e de instrumentos particulares de procurações, cujo prazo não poderá ser superior a 90 dias;
DA LAVRATURA DOS ATOS NOTARIAIS
Disposições Gerais
42. O Tabelião de Notas, antes da lavratura de quaisquer atos, deve:
c) conferir as procurações para verificar se obedecem à forma exigida, se contêm poderes de representação para a prática do ato notarial e se as qualificações das partes coincidem com as do ato a ser lavrado, observando o devido sinal público e o prazo de validade da certidão, que não poderá exceder a 90 dias;
Procurações
131. A procuração outorgada para a prática de atos em que exigível o instrumento público também deve revestir a forma pública.
131.1. Entende-se por poderes especiais na procuração para os fins do art. 661, §1º, do Código Civil, a expressão “todos e quaisquer bens imóveis” ou expressão similar, sendo desnecessária a especificação do bem.
Textos Jurídicos
1)Moacyr Petrocelli
14 de ago. de 2024
STJ | Procuração para alienação de bens imóveis. Necessidade de especificação do bem. Poderes especiais e expressos.
Diz o Código Civil, em seu art. 661, § 1º, que para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos.
Ainda hoje arvoram-se debates a respeito da necessidade ou não da descrição ou individualização do imóvel (ou dos imóveis) que pode(m) ser objeto de alienação ou oneração pelo procurador.
Reafirmando sua jurisprudência consolidada o Superior Tribunal de Justiça decidiu:
A validade de ato de disposição de bens imóveis por meio de procuração requer a concessão de poderes especiais e explícitos, acompanhados da descrição detalhada do objeto a ser transferido, negociado ou dado em garantia.
Com boa clareza, sedimentou-se:
A outorga de poderes de alienação de todos os bens do outorgante não supre o requisito de especialidade exigido por lei que prevê referência e determinação dos bens concretamente mencionados na procuração.
Em sede doutrinária tem prevalecido esta posição do STJ, consolidada também no Enunciado 183 das Jornadas de Direito Civil do CJF:
Para os casos em que o parágrafo primeiro do art. 661 exige poderes especiais, a procuração deve conter a identificação do objeto.
Em sentido oposto, no entanto, é possível encontrar previsão nas Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo:
Entende-se por poderes especiais na procuração para os fins do art. 661, §1º, do Código Civil, a expressão “todos e quaisquer bens imóveis” ou expressão similar, sendo desnecessária a especificação do bem. (NSCGJ-SP, Cap. XVI, Item 131.1).
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Cf. STJ – AgInt no REsp 2.038.444/MT, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j.10/6/2024.
Petrocelli, Moarcyr, “STJ | Procuração para alienação de bens imóveis. Necessidade de especificação do bem. Poderes especiais e expressos.”, in <https://www.moacyrpetrocelli.com/post/stj-procura%C3%A7%C3%A3o-para-aliena%C3%A7%C3%A3o-de-bens-im%C3%B3veis-necessidade-de-especifica%C3%A7%C3%A3o-do-bem-poderes-espec>i , visitado em 14/04/2025
2) Poderes gerais x expressos e especiais
Procurações públicas oriundas do estrangeiro para efeitos no Brasil
Felipe Leonardo Rodrigues
quarta-feira, 19 de maio de 2021
Inúmeras são as procurações apresentadas nos tabelionatos de notas do Brasil para a celebração de negócios jurídicos que, por descuido, não apresentam os poderes especiais e expressos exigidos pelo art. 661, § 1º, CC.
Mas o que é poderes especiais e expressos? A doutrina vem desmistificando tais requisitos de espectro tão genéricos:
Cláudio Luiz Bueno de Godoy leciona que, poderes expressos identificam, de forma explícita (não implícita ou tácita), exatamente qual o poder conferido (por exemplo, o poder de vender). Já os poderes serão especiais quando determinados, particularizados, individualizados os negócios para os quais se faz a outorga (por exemplo, o poder de vender tal ou qual imóvel).42
Pontes de Miranda diz que, mandato expresso e mandato com poderes especiais são conceitos diferentes. É expresso o mandato em que se diz: ‘com poderes para alienar, hipotecar, prestar fiança’. Porém não é especial. Por conseguinte, não satisfaz as duas exigências do art. 1.295, § 1º, do Código Civil (atual 661, § 1°) que fala de ‘poderes especiais e expressos’. Cf. o Código Comercial, art. 134, ‘in fine’, poderes expressos são os poderes que foram manifestados com explicitude. Poderes especiais são os poderes outorgados para a prática de algum ato determinado ou de alguns atos determinados. Não pode hipotecar o imóvel ‘a’ o mandatário que tem procuração para hipotecar, sem se dizer qual o imóvel: recebeu poder expresso, mas poder geral, e não especial.43
Carvalho Santos esclarece que, o Código exige não só poderes expressos, mas também especiais, o que vale dizer: para que o mandatário possa alienar bens do mandante faz-se mister que expressamente a procuração lhe confira poderes para tanto, com referência a determinado ou determinados bens especializados, ou concretamente mencionados na mesma procuração.44
Silvio Rodrigues, numa interpretação mais consentânea à realidade e dinâmica dos negócios imobiliários ensina que, se o outorgante confere ao procurador poderes para vender ou hipotecar bens imóveis sem dizer quais os bens que o representante pode alienar ou hipotecar, assume o risco de que este venda ou hipoteque os que entender. O que é perfeitamente justificável, tendo em vista que o mandato é um negócio com base na confiança que o constituinte deposita no representante. Querer interpretar de maneira excessivamente estrita as cláusulas do mandato constitui uma tentativa descabida e injusta de tutelar o interesse de pessoa capaz, que não encontra fundamento nem na lei nem no interesse social.45 (Grifo nosso)
Neste sentido, Clóvis Bevilaqua ressalta que, o mandato geral, ainda que declare que o mandante terá todos os poderes, libera administratio, somente confere os da administração ordinária. O mandato para conferir direitos, que excedam da administração ordinária, deve ser especial, isto é, devem os poderes referir-se, expressa e determinadamente, ao negócio jurídico. “O mandato relativo a todos os negócios do mandante, omnium rerum não se restringirá aos atos de simples administração, desde que expressamente conferir poderes para os diferentes atos que os exigem especiais”.46 (Grifo nosso)
Carvalho Santos, citado por Arnaldo Marmitt, rechaça as dúvidas e assevera a necessidade dos poderes expressos e especiais para poder o mandatário alienar bens de propriedade do mandante resulta, também, a necessidade de constarem na procuração os bens a serem vendidos, devidamente individualizados, a não ser que os poderes abranjam todos os bens do mandante.47 (Grifo nosso)
O Superior Tribunal de Justiça vem deliberando nesta mesma linha de pensamento, sobre a necessidade de poderes expressos e especiais: REsp. 79.660-RS, j. 25/11/1996, rel. nin. Waldemar Zveiter; REsp. 262.777-SP, j. 5.2.2009, rel. min. Luís Felipe Salomão; REsp. 31.392-SP, j. 25/08/1997, rel. nin. Waldemar Zveiter; RE 84.501-RJ e RE 90.779-3-RJ, é de ressaltar, neste último, o seguinte trecho:
“Não nega vigência ao art. 1.295, § único, do Código Civil, o acórdão que anula doação feita com procuração que não especifica o bem a ser doado, nem o donatário, quando o mandatário, às vésperas do desquite, usando procuração genérica com poderes para alienar os bens do casal, doa parte do imóvel da esposa ao filho do casal, à revelia da mandante, com quem era casado pelo regime da separação absoluta de bens”.
O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, sinaliza nesta mesma direção:
“Apelação Cível 524-6/3 – Serra Negra – j. 03/08/2006, Apelação Cível 982-6/2 – Capital – j. 17/03/2009 e Apelação Cível 990.10.473.290-5 – Capital – j. 07.07.2011.
Apelação Cível 0024552-06.2012.8.26.0100 – Capital – j. 02/04/2013, rel. des. José Renato Nalini, prestigiando os precedentes administrativos a respeito, anotou o seguinte extrato do voto do Exmo. Des. Gilberto Passos de Freitas, Corregedor Geral da Justiça à época, na Apelação Cível n. 524-6/3, j. 03/08/2006″
Assim, podemos concluir que:
a) Os poderes especiais e expressos (citados no § 1º do artigo 661 do Código Civil) são requisitos distintos. Os expressos são aqueles mencionados no mandato, sem margem a táciticidade (por exemplo: vender, hipotecar, dar em pagamento, etc.). Os especiais correspondem ao objeto, é a especificação (e está intimamente ligado aos poderes expressos), por exemplo: vender o imóvel Y, doar o imóvel X em favor do donatário W etc.;
b) A procuração que conste poderes expressos para vender ou hipotecar, sem identificar o objeto do negócio jurídico a ser realizado, vale dizer, sem poderes especiais, não deve ser aceita, sob pena de nulidade;
c) A procuração que conste poderes gerais expressos para alienar, de modo a abranger todos os bens imóveis do mandante, é desnecessária a especialização (descrição) de cada um dos bens, pois o mandante, ciente dos poderes expressamente outorgados, consentiu em todos e quaisquer bens.
Felipe Leonardo Rodrigues
Rodrigues, Felipe Leonardo, “Procurações públicas oriundas do estrangeiro para efeitos no Brasil“, in <https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/345716/procuracoes-publicas-oriundas-do-estrangeiro-para-efeitos-no-brasil> , visitado em 14/04/2025