Integralização de Capital – Instrumento Particular – Diferença de Avaliação
Recebi para registro uma instrumento particular de conferência de bens para integralização de capital social. O capital da empresa era R$2.183.469,00 e passou para R$2.206.805,00, houve um aumento de R$23.336,00.
Um dos proprietários fez este aumento com integralização de 6 imóveis que somando as avaliações é igual a R$36.335,00. Este documento foi registrado na Junta Comercial em 20/10/2022.
Posso fazer estes registros?
Resposta:
- A rigor nos termos do artigo 64 da Lei 8.934/94 é possível o registro dos imóveis por instrumento particular de conferência de bens para a integralização de aumento de capital social da pessoa jurídica por um dos sócios;
- Entretanto há uma diferença de valor entre a integralização e o valor da avalição dos imóveis (laudo de avaliação) no valor de R$ 12.999,00 a menor, que precisa ser esclarecido ou se for o caso a conferência de bens para a integralização de capital social ser rerratificada junto a JUCESP para constar o valor correto, ou seja, o valor da avalição dos bens imóveis;
- Deverá também ser apresentado o valor venal atual (último lançamento) dos imóveis para fins de cálculo de emolumentos (nos termos do artigo 7º I, II e III da Lei Estatual de nº 11.331 de 26 de dezembro de 2.002;
- Também deverá ser apresentada o conjunto das guias de recolhimento das ITBI’s ou as guias de isenção/e/ou de não incidência (se for o caso) expedidas pela Municipalidade local. Ver decisão da 1ª VRP da Capital de nº 1133800-35.2022.8.26.0100 de 12-01-2.023 abaixo reproduzida.
Sub censura.
São Paulo, 15 de Janeiro de 2.022.
LEI Nº 8.934, DE 18 DE NOVEMBRO DE 1994.
Art. 64. A certidão dos atos de constituição e de alteração de empresários individuais e de sociedades mercantis, fornecida pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou para o aumento do capital. (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021)
DJE DE 13-01-2023 – INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE E TERCEIRA ALTERAÇÃO REGISTRADOS NA JUCESP. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DO ITBI.
Note-se, ainda, que, no caso concreto, a parte interessada apresentou requerimento de não incidência perante o ente público, o qual indeferiu o pedido (fls. 118/119 e 123/131), a confirmar a correção da recusa.
Processo 1133800-35.2022.8.26.0100 1ª VRP – CAPITAL.
Dúvida – Registro de Imóveis – Ótima Empreendimentos e Participações Ltda – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: JEFFERSON ROSA RODRIGUES (OAB 290874/SP)
Íntegra da decisão:
Processo Digital nº: 1133800-35.2022.8.26.0100
Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis
Suscitante: 5º Oficial de Registro de Imóveis
Suscitado: Ótima Empreendimentos e Participações Ltda
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Ótima Empreendimentos e Participações Ltda, tendo em vista negativa em se proceder ao registro de instrumento particular de constituição da sociedade e de instrumento particular de terceira alteração do contrato social, devidamente registrados perante a Jucesp, os quais envolvem as matrículas n. 28.827, 58.904 e 58.906 daquela serventia.
Segundo o Oficial, a negativa foi motivada pela não apresentação de guia de recolhimento do imposto de transmissão inter vivos ou deferimento de não incidência pela Prefeitura Municipal (artigo 289 da LRP; artigo 30, inciso VI, da Lei n. 8.935/94 e artigos 134 e 135 do CTN).
Documentos vieram às fls. 05/122.
Em manifestação dirigida ao Oficial e em impugnação, a parte suscitada defendeu a não ocorrência de fato gerador, que somente surge com o registro, informando, ainda, que a exigibilidade do tributo está sendo questionada junto ao ente público (fls. 85/99 e 123/131).
O Ministério Público opinou pela procedência (fls. 134/135).
É o relatório.
Fundamento e decido.
No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.
Para os registradores, vigora ordem de controle rigoroso do pagamento de imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (art. 289 da Lei n. 6.015/73, art. 134, VI, do CTN e art. 30, XI, da Lei n. 8.935/1994).
No que pertine ao imposto de transmissão inter vivos, a Constituição Federal fixou a competência dos municípios para instituição e regulação das hipóteses de não incidência:
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
II – transmissão ‘inter vivos’, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; (…)
§ 2º O imposto previsto no inciso II:
I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil”.
Ao tratar da hipótese excepcional de não incidência, o Código Tributário Nacional estabelece:
“Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição.
§ 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo.
§ 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.
§ 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data”.
A hipótese de não incidência do tributo, portanto, não é geral e irrestrita a toda e qualquer integralização de capital social, devendo ser considerada para tanto a natureza da atividade preponderantemente desenvolvida pela pessoa jurídica.
A verificação das hipóteses incumbe, obviamente, ao ente público municipal a quem atribuída a competência exclusiva para tributação.
Ao tratar do assunto, o Município de São Paulo previu hipótese de não incidência do imposto de transmissão inter vivos a depender da natureza da atividade desenvolvida de forma preponderante pela empresa, remetendo à Secretaria Municipal de Finanças a incumbência para disciplinar o procedimento a fim de que se alcance o reconhecimento (artigos 3º, III, 4º e 5º do Decreto Municipal nº 51.627/2010, que regulamentou a Lei Estadual nº 11.154/1991).
O Decreto n. 55.196, de 11 de junho de 2014, repetiu as mesmas disposições:
“Art. 3º O Imposto não incide: (…)
II – sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoas jurídicas em realização de capital; (…)
Art. 4º Não se aplica o disposto nos incisos III a V do artigo 3º deste regulamento quando o adquirente tiver como atividade preponderante a compra e venda desses bens ou direitos, a sua locação ou arrendamento mercantil.
§ 1º. Considera se caracterizada a atividade preponderante quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional do adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas no “caput” deste artigo.
§ 2º. Se o adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar se á a preponderância referida no §
1º deste artigo levando em consideração os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.
§ 3º. Fica prejudicada a análise da atividade preponderante, incidindo o Imposto, quando a pessoa jurídica adquirente dos bens ou direitos tiver existência em período inferior ao previsto nos §§ 1º e 2º deste artigo.
Art. 5º A Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico disciplinará os procedimentos necessários para a concessão de isenção e o reconhecimento da não incidência e da imunidade, relativamente ao Imposto”.
Assim, se há procedimento devidamente regulamentado pelo ente competente, deverá ser observado, não cabendo ao Registrador nem a este juízo administrativo valorar a natureza da atividade informada.
Em outros termos, deve a parte interessada se valer da via adequada a fim de alcançar o reconhecimento de não incidência do tributo. Neste sentido o decidido por este juízo no processo de autos n. 1020963-36.2019.8.26.0005.
Note-se que a hipótese de incidência surge justamente na ocasião do registro do título como reconheceu o STF, com repercussão geral, no julgamento de mérito do Recurso Extraordinário com Agravo n. 1.294.969/SP (processo-paradigma do Tema n. 1124 – ITBI – Ausência – Registro – Cartório):
“O fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro”.
Note-se, ainda, que, no caso concreto, a parte interessada apresentou requerimento de não incidência perante o ente público, o qual indeferiu o pedido (fls. 118/119 e 123/131), a confirmar a correção da recusa.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida para manter o óbice registrário.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 11 de janeiro de 2023.
Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Juíza de Direito (Acervo INR – DJe de 13.01.2023 – SP)