A Arrecadação em Processos de Falência

Recebi do Foro da Comarca um Ofício para proceder com ‘Arrecadação de imóveis’ em processo falimentar. Solicito que me auxilie para fazer cumprir o determinado.

1) a matrícula em análise, pertence a Fulano. Existe uma hipoteca e penhora à favor da empresa XYZ Agroc. Industrial Ltda, sendo devedora a empresa WKY e Representações de Produtos Agricolas Ltda.

2) com referência às demais matriculas 8 – 9 – 10 e 9111, já foram alienados ha mais de cinco anos.

3) em relação a matricula 23, pertence somente a Fulano, e existe uma hipoteca e penhora a favor da referida empresa XYZ… (mesmo item 1 acima)

Em janeiro de 2025 recebemos o Ofício, onde foi averbado na matrícula 23, a indisponibilidade, e fizemos a nota devolutiva referente demais imóveis.

Como devemos proceder?

A arrecadação seria a favor de quem? e o valor?

Resposta:

  1. A Arrecadação da Falência, embora não prevista expressamente em Lei, pode ser averbada com base nos artigos nºs. 167, II, 12, 215 e 246 da Lei de Registros Públicos. Averba-se a arrecadação do bem para dar publicidade – não só a esse ato – mas em especial para dar publicidade da falência.  Portanto, a averbação da arrecadação pode ser feita, impedindo nos termos do artigo n. 215 antes citado, quaisquer registros posteriores (ver RDI n. 53 páginas 137/141 item 1.10 “A Arrecadação no Processo Falimentar”, Boletim Eletrônico do Irib n. 2.227 de 23.12.2.005 – Jurisprudência Selecionada – Averbação da decretação da falência e APC n. 011150-0/0); Ambos textos seguem abaixo reproduzidos.
  2. Como não se trata de alienação, mas averbação para fins de publicidade, a indisponibilidade não impedirá a averbação da arrecadação que deve ser feita, impedindo nos termos do artigo n. 215 antes citado quaisquer registros posteriores;-
  3. Quando averbada a arrecadação, pois decretada a falência, implica na consequência de que, nos termos do artigo n. 215 da LRP, via de regra, nenhum ato poderá mais ser praticado sem autorização do Juízo Falimentar;
  4. Não há de fato valor do bem, porém não será necessário, pois não se trata de execução, mas de arrecadação cujo bem será avaliado (artigos 108 e 110 da Lei 11.101/05)
  5. Deverá a serventia comunicar o Juízo do ato encaminhando certidão da matrícula após a averbação da arrecadação, bem como realizar o lançamento no indicador pessoal e a cópia dos documentos ser arquivada em pasta própria (artigo 215 da LRP)
  6. (Ver artigos 167, II, 12, 215 e 246 da LRP e 22 III, letra “f”, 76, e seu parágrafo único, 108, e seus parágrafos 1º a 4º, 110, parágrafo1º, 2º, incisos III e IV, 3º e 4º, 116,I, 139, 192 e seu parágrafo 1º, da Lei 11.101/2005 todos abaixo transcritos.
  7. Se a arrecadação é somente do imóvel objeto da matricula em análise, que está registrado em nome da pessoa física de Fulano que é sócio da Empresa Falida, a arrecadação deveria ser averbada nessa matrícula.  
  8. Entretando se a Responsabilidade do sócio for Limitada não será possível, se for Ilimitada em tese poderia. Entretanto no caso, seria de bom tom que houvesse a desconsideração da personalidade jurídica, mas não foi o que ocorreu (Ver artigos 81 e 82 da Lei 11.101/05). Dessa forma é melhor informar ao Juízo de que o imóvel se encontra registrado em nome de  Fulano como pessoa física, e que existe uma hipoteca e uma penhora a favor  da empresa XYZ Agropecuária – sendo a devedora a Empresa Falida, somente isso.
  9. Informando também ao juízo, que em relação as matriculas 08 – 09 – 10 e 11, já foram alienadas há mais de cinco anos e pertencem a terceiros. E referente a matricula 23, informe que a averbação da indisponibilidade determinada já for averbada, encaminhado certidões de todas as matrículas.

É o parecer sub censura.

São Paulo, 06 de Maio de 2.025

LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973.

 Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.  (Renumerado do art. 168 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

  II – a averbação: (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975).

        12) das decisões, recursos e seus efeitos, que tenham por objeto atos ou títulos registrados ou averbados;

    Art. 215 – São nulos os registros efetuados após sentença de abertura de falência, ou do termo legal nele fixado, salvo se a apresentação tiver sido feita anteriormente. (Renumerado do art. 216 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

  Art. 246 – Além dos casos expressamente indicados no item II do artigo 167, serão averbados na matrícula as subrogações e outras ocorrências que, por qualquer modo, alterem o registro.(Renumerado do art. 247 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975)

LEI No 11.101, DE 9 DE FEVEREIRO DE 2005.

 Art. 22. Ao administrador judicial compete, sob a fiscalização do juiz e do Comitê, além de outros deveres que esta Lei lhe impõe:

        III – na falência:

        f) arrecadar os bens e documentos do devedor e elaborar o auto de arrecadação, nos termos dos arts. 108 e 110 desta Lei;

Art. 76. O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo.

        Parágrafo único. Todas as ações, inclusive as excetuadas no caputdeste artigo, terão prosseguimento com o administrador judicial, que deverá ser intimado para representar a massa falida, sob pena de nulidade do processo.

  Art. 108. Ato contínuo à assinatura do termo de compromisso, o administrador judicial efetuará a arrecadação dos bens e documentos e a avaliação dos bens, separadamente ou em bloco, no local em que se encontrem, requerendo ao juiz, para esses fins, as medidas necessárias.

        § 1o Os bens arrecadados ficarão sob a guarda do administrador judicial ou de pessoa por ele escolhida, sob responsabilidade daquele, podendo o falido ou qualquer de seus representantes ser nomeado depositário dos bens.

        § 2o O falido poderá acompanhar a arrecadação e a avaliação.

        § 3o O produto dos bens penhorados ou por outra forma apreendidos entrará para a massa, cumprindo ao juiz deprecar, a requerimento do administrador judicial, às autoridades competentes, determinando sua entrega.

        § 4o Não serão arrecadados os bens absolutamente impenhoráveis.

   Art. 110. O auto de arrecadação, composto pelo inventário e pelo respectivo laudo de avaliação dos bens, será assinado pelo administrador judicial, pelo falido ou seus representantes e por outras pessoas que auxiliarem ou presenciarem o ato.

        § 1o Não sendo possível a avaliação dos bens no ato da arrecadação, o administrador judicial requererá ao juiz a concessão de prazo para apresentação do laudo de avaliação, que não poderá exceder 30 (trinta) dias, contados da apresentação do auto de arrecadação.

        § 2o Serão referidos no inventário:

        III – os bens da massa falida em poder de terceiro, a título de guarda, depósito, penhor ou retenção;

        IV – os bens indicados como propriedade de terceiros ou reclamados por estes, mencionando-se essa circunstância.

        § 3o Quando possível, os bens referidos no § 2o deste artigo serão individualizados.

        § 4o Em relação aos bens imóveis, o administrador judicial, no prazo de 15 (quinze) dias após a sua arrecadação, exibirá as certidões de registro, extraídas posteriormente à decretação da falência, com todas as indicações que nele constarem.

Art. 116. A decretação da falência suspende:

        I – o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial;

     Art. 139. Logo após a arrecadação dos bens, com a juntada do respectivo auto ao processo de falência, será iniciada a realização do ativo.

Art. 192. Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945.

        § 1o Fica vedada a concessão de concordata suspensiva nos processos de falência em curso, podendo ser promovida a alienação dos bens da massa falida assim que concluída sua arrecadação, independentemente da formação do quadro-geral de credores e da conclusão do inquérito judicial.

Texto Dr. Sérgio Jacomino e Acórdãos sobre o tema:

Boletim Eeletrônico IRIB nº 2227

Averbação da decretação da falência
Aspectos práticos no registro de imóveis
Sérgio Jacomino*


No segundo semestre desse ano tivemos que enfrentar um caso muito interessante, que acabou redundando num procedimento que vem de ser decidido pelo magistrado da Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo, Dr. Venício de Paula Salles, com a costumeira precisão e domínio de temas tão inçados de dificuldades.

Temas como: concurso de credores, indisponibilidade e impenhorabilidade, dinâmica das penhoras de créditos preferentes etc. são feridos com profundidade e acuidade. Vamos ao caso concreto.

O caso  

Foi-nos apresentado a registro mandado judicial de averbação com a expressa determinação de “registro da arrecadação falimentar de imóvel matriculado” no registro sob nossa responsabilidade.

Dois foram os óbices opostos à imediata prática dos atos determinados:
 

    1. Existência de prévia prenotação de mandado judicial de indisponibilidade de bens extraído do processo trabalhista, realizada nos termos do Provimento 17/99 da Eg. Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo e

    2. Registro de penhoras em favor do INSS e Fazenda Nacional, o que tornaria o imóvel indisponível (art. 53 § da Lei 8.212/91 ).


O juízo falimentar retornou o título com a reiteração da determinação de averbação da arrecadação; se houvesse qualquer dúvida quanto ao cumprimento da ordem judicial, que o Registro “se insurja perante a Corregedoria-Permanente”, conforme grafou no ofício. Só essa determinação daria ensanchas a interessante discussão: poderia o R. juízo, manifestando interesse no registro, suscitar dúvida? Temos precedente: Ap. Cível 16.923-0/4, de Cubatão, DOE de 14/6/1993, relator desembargador José Alberto Weiss de Andrade.

Muito bem. Superada essa questão, vamos ao ponto.

Aos colegas registradores de outros Estados peço vênia para fazer uma incursão nas Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do meu Estado.

O articulado dos itens 102.1 e seguintes das Normas de Serviço da Eg. Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo poderia vir perfeitamente em socorro do R. Juízo falimentar.

Houve a prenotação de título judicial que não “conta com previsão legal específica para ingresso no Registro” (item 102.1). Como se sabe, a prenotação deverá ser prorrogada até a solução definitiva da pendência judicial com as providências que forem então determinadas – ou a revogação da ordem neles contida (item 102.2).

Enfim, com a prenotação subseqüente do título judicial sob exame, as posições ficariam mantidas até solução definitiva do processo trabalhista, de cujo seio originou-se a determinação de indisponibilidade, dando ocasião, eventualmente, à averbação determinada.

Princípios da indivisibilidade e da universalidade do juízo da falência  

Mas havia pormenores no caso concreto que mereciam ser verificados atentamente. Seria de rigor a observância dos princípios da indivisibilidade e da universalidade do juízo da falência?

Faço esse reparo na consideração de que a ação em tela se iniciou antes da vigência da nova Lei de Falências e, a teor do art. 192 da Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, a nova regra não se aplicaria aos processos ajuizados anteriormente. Se assim é, efetivamente, seria o caso de relevar o sentido da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que aponta o juízo da falência como o desaguadouro necessário das execuções em curso?

Para tanto é necessário responder a duas ordens de questões:

1) a arrecadação no caso de decretação de falência é averbável?

2) É possível, em face do princípio da indivisibilidade e da universalidade do juízo da falência, ultrapassar as indisponibilidades que decorrem de ordem judicial extraída de ação trabalhista ou decorrentes de Lei?

É claro que as questões não têm maiores repercussões práticas, já que ambos os títulos achavam-se prenotados e seriam logicamente reportados nas certidões que se expedissem. Ademais, os incidentes processuais seriam resolvidos no âmbito jurisdicional, com a comunicação recíproca – coisa que o juiz Venício de Paula Salles determina na decisão abaixo. Finalmente, a averbação da arrecadação não teria virtude maior do que simplesmente dar notícia do fenômeno processual em curso na vara falimentar, não tendo o condão de alterar a substância dos direitos concorrentes e preferenciais.

O enfrentamento da questão se deu exclusivamente em virtude da interessante provocação do Juízo falimentar.

Averbação da arrecadação na falência.  

Não há expressa previsão legal do acesso do título reportando a arrecadação falimentar. O elenco do art. 167 da Lei de Registros Públicos é considerado exaustivo e não comporta, segundo a orientação jurisprudencial amplamente dominante, elastério para alcançar hipóteses não previstas no rol fechado de fatos inscritíveis. É a teoria denumerus clausus dos fatos inscritíveis. (Faço um parêntesis para referir um excelente artigo de Ricardo Dip – São taxativos os atos registráveis?  – a cuja doutrina me filio).

É preciso reconhecer que o art. 246 da Lei 6.015/73 é uma porta aberta para a averbação de fatos e ocorrências que possam alterar o registro. A decretação da falência faz surgir uma nova situação jurídico-patrimonial da falida e bastaria com assinalar a regra do artigo 215 da mesma lei (que reputa nulos os registros efetuados após sentença de abertura de falência, ou do termo legal nele fixado), para se compreender que a publicidade registral da situação falimentar tem relevância para os terceiros de boa-fé e bem por isso merece guarida no registro.

O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo já teve ocasião de enfrentar o tema:

Dada a relevância do ato praticado na esfera jurisdicional, que limita a disponibilidade do bem imóvel arrecadado, convém ao sistema registrário admiti-lo mediante ato averbatório. O registro visa, dentre outras finalidades, assegurar a validade e a normalidade dos negócios jurídicos, sendo de cautela dar publicidade do ato constritivo e dar a este garantia registral da apreensão (art. 167, II, n.º 12, Lei n.º 6.015/73 )” ( Ap. Civ. 11150-0/0, DOE 6/7/1990, São José do Rio Preto, Relator Desembargador Onei Raphael, cópia anexa).

Ultrapassada a questão da admissibilidade da averbação, restaria enfrentar as demais questões.

Juízo universal da falência  

Há a tendência, digna de nota, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de que em sede de juízo falimentar o crédito trabalhista se sujeita a rateio entre os de igual natureza, pelo que não se enquadra na exceção prevista no art. 24, parágrafo 2º, I, do Decreto-Lei nº 7.661/45:

Competência. Conflito. Justiça trabalhista e juízo falimentar. Execução de créditos trabalhistas. Falência superveniente à penhora. Juízo universal. Indivisibilidade. Universalidade. I – Consoante entendimento de vanguarda da 2ª Seção desta Corte Superior o crédito trabalhista sujeita-se a rateio entre os de igual natureza, pelo que não se enquadra na exceção prevista no art. 24, parágrafo 2º, I, do Decreto-Lei nº 7.661/45. II – Sobrevindo falência, a execução trabalhista já não pode prosseguir, ainda que haja penhora anteriormente realizada, salvo se já aprazada a praça ou arrematados os bens, ao tempo de sua declaração, sob pena de romper-se os princípios da indivisibilidade e da universalidade do juízo da falência, com manifesto prejuízo para os credores”. (Brasília 14/11/2000. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Conflito de Competência nº 26.162/RJ; DJU 7/12/2000; pg. 254/255).

É do corpo do V. acórdão o seguinte trecho:

Encontra-se assente na 2ª Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a falência produz efeitos sobre a execução trabalhista, cujo crédito, por estar sujeito a rateio dentre os de igual natureza, submete-se à força atrativa do juízo universal da falência. Como conseqüência, refoge à competência trabalhista a execução da reclamatória ajuizada perante a Junta laboral, que encerra sua prestação jurisdicional com a liquidação do crédito reclamado, visto que, para ser habilitado na falência deve ter o seu valor estabelecido pela sentença trabalhista”.

Tal compreensão tem como escopo proteger, numa dimensão alargada e em igualdade de condições, todos os trabalhadores atingidos pela falência da empresa empregadora”.

Assim respeitada a universalidade e indivisibilidade do juízo falimentar, evita-se uma pulverização de ações em juízos diversos em detrimento da economia processual e do princípio da igualdade entre os credores. Por conseguinte, permite-se um maior controle dos créditos e da força patrimonial da massa, o que, em última análise, assegura o seu exaurimento pro rata, sem preferências ou prejuízos manifestos dentro de uma mesma classe de credores”

E cita precedentes da Corte:

“Processual civil. Ação trabalhista. Arrematação. Empresa reclamada cuja quebra fora decretada anteriormente. Universalidade do juízo falimentar. Lei n. 7.661/45. Arts. 7º, § 2º, 24 e 70, § 4º. I – A 2ª Seção, em precedentes mais modernos, decidiu que o crédito decorrente de salário está sujeito a rateio dentre os de igual natureza, pelo que não se enquadra na exceção prevista no art. 70, parágrafo 2º, I, da Lei n. 7.661/45. II – Destarte, não ocorrendo interessados na praça, se a adjudicação, pela reclamante, do bem penhorado em execução trabalhista, é posterior à decretação da quebra da empresa reclamada, o ato fica desfeito em face da competência universal do juízo falimentar, ao qual caberá processar o crédito da ex-empregada, e o eventual rateio. III – Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo de Direito suscitado, da 3ª Vara Cível de Araçatuba, Estado de São Paulo.” ( CC 26918/SP; DJ 3/4/2000, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior);

Conflito positivo de competência. Execução trabalhista contra massa falida. Penhora realizada antes da quebra. Designação da praça depois dela pelo juízo trabalhista. Invalidade. Competência do juízo falimentar para marcar nova hasta pública. Deve ser sustada a hasta pública designada, pelo juízo trabalhista, depois de decretada a quebra, e outra ser marcada pelo juízo falimentar, sendo o produto da alienação entregue à massa a fim de que seja efetuado o pagamento, depois do devido rateio, de quantos credores trabalhistas existirem. Conflito conhecido e declarada a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública. Falência e Concordatas de Curitiba, o suscitante.” ( CC 19929/PR; DJ: 19/10/1998, Rel. Min. César Asfor Rocha);

Conflito de competência. Falência. Execução trabalhista. O julgamento dos litígios entre empregados e empregadores far-se-á na Justiça Trabalhista. Entretanto, decretada a quebra, a alienação judicial dos bens será efetuada no juízo falimentar, a quem caberá decidir sobre eventual rateio. Se, quando da falência, já houver praça ou leilão designado, com publicação de editais, proceder-se-á à alienação, devendo o respectivo produto ser transferido para a massa.” ( CC 19431/PE; DJ: 9/11/1998, Rel. Min. Eduardo Ribeiro);

Conflito de competência. Execução trabalhista. Falência superveniente da empresa. A execução trabalhista já não pode prosseguir, se decretada a quebra da empresa, ainda que a penhora tenha sido feita anteriormente, salvo se já aprazada a praça; realizada a praça o no juízo trabalhista, a totalidade do preço deve ser transferida ao juízo falimentar. Conflito conhecido para declarar competente o MM. Juízo da 7ª Vara Cível de Osasco.” ( CC nº 19.468/SP, 2ª Seção, Relator o Senhor Ministro Ari Pargendler, DJ: 7/6/99)

A regra da vis attractivafalimentar foi confirmada no art. 76 da atual Lei de Falências.  

Esgotado oiter processual que torna líquido o crédito trabalhista, este deverá ser inscrito e habilitado no rol falimentar para satisfação dos interesses envolvidos. Nesse caso, é pouco razoável impedir o acesso do título que noticia a arrecadação falimentar.

Resumindo, o processo falimentar exerce uma força atrativa sobre os demais feitos de interesse da massa; a regra é consagrada no princípio da universalidade do juízo da falência. É digno de registro, entretanto, que cabe exceção às causas trabalhistas, “que deverão ser decididas pelo próprio juiz especializado do trabalho, devendo ser habilitada na falência importância que aquela justiça especializada entender como correta”, nas palavras do magistrado Manoel Justino Bezerra Filho (Nova lei de recuperação e falências comentada. São Paulo: RT, 3ª. Edição, 2ª tiragem, 2005. p. 193).

Indisponibilidade de bens na execução fiscal  

Outra das hipóteses de exceção à atração do juízo falimentar é a execução fiscal. A fazenda pública não se sujeita ao concurso universal na falência, podendo levar o bem à hasta pública – ainda que o produto da venda deva ser encaminhado à massa.

Nesse caso específico, o registro das penhoras tiradas de execuções fiscais da Fazenda Nacional teria o condão de tornar efetivamente indisponível o bem, fechando as portas do registro a eventual alienação que pudesse, inclusive, ser decidida no âmbito da falência?

A existência de prévia prenotação de determinação judicial de indisponibilidade de bens extraída do processo trabalhista, prenotada regularmente nos termos do Provimento 17/99 da Eg. Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo, representaria um empecilho de caráter formal – afinal, a prenotação estaria em vigor. Além disso, existem registros de penhoras em favor do INSS e Fazenda Nacional, o que tornaria o imóvel indisponível (art. 53 § 1º da Lei 8.212/91 ).

Assim postas as questões, o Dr. Venício Antonio de Paula Salles acaba de decidir a dúvida e aproveita para baixar regra aplicável aos registros prediais da Capital de São Paulo com o fim de “aperfeiçoar a organização deste complexo procedimentoconcursal”. Doravante, os oficiais de registro deverão oficiar ao juízo responsável pela penhora antecedente, informando-o sobre o registro das penhoras subseqüentes. Segundo o magistrado, a “determinação é feita em caráternormativo para que o concurso de credores se instaure de forma mais própria e transparente”.

E determinou a averbação perseguida pelo Juízo falimentar.

A decisão ainda não transitou em julgado, de forma que ainda pode ser eventualmente reformada. Entretanto, as determinações normativas ali ínsitas independem de reapreciação no caso de recurso, razão pela qual a decisão é aqui publicada com a expressa autorização do juiz-corregedor dos registros prediais da Capital de São Paulo.

Vamos à decisão!

Título judicial – qualificação registral. Penhora – INSS – Fazenda Nacional – concurso coletivo de credores. Falência – mandado de averbação – arrecadação – taxatividade –numerus clausus. Indisponibilidade.

EMENTA NÃO OFICIAL: 1. A ordem judicial não se encontra infensa à “qualificação” registral. 2. A penhora efetuada em favor do INSS não obsta penhora subseqüente a favor da Fazenda Nacional. 3. A indisponibilidade não produz qualquer novo tipo de preferência ou prioridade, impedindo, apenas, a alienação do bem pelo devedor, já que se trata de uma garantia para a execução e não uma prerrogativa adicional para o crédito. 4. A indisponibilidade dos créditos a favor da Fazenda Nacional não impede a arrecadação para que o bem imóvel responda pela liquidação de outros créditos de privilégio superior. Dúvida improcedente.

Processo nº: 583.00.2005.117546-2

Vistos, etc …

Cuida-se de procedimento administrativo de dúvida registral suscitada, nos termos do art. 198 da Lei de Registros Públicos, pelo Oficial do 5°SRI. Informou que não reconheceu condições para promover a QUALIFICAÇÃO POSITIVA de mandado de ARRECADAÇÃO, expedido pelo juízo Falimentar da 26ª Vara Cível Central, em razão da existência de INDISPONIBILIDADE gravando e onerando o imóvel objeto da matricula n° 75.593, ante a existência de precedentes penhoras prestigiando o INSS e a FAZENDA FEDERAL.

Apresentou argumentos e entendimentos jurisprudenciais pugnando pelo processamento da presente dúvida. Juntou documentos.

O processo teve tramitação sem impugnação do interessado.

O Ministério Público se manifestou pela procedência da dúvida.

É o relatório.

DECIDO:

Pacífico é o entendimento jurisprudencial, de que a ordem judicial não se encontra infensa à “qualificação” registral. Entretanto, o trabalho registral não visa questionar a ORDEM JUDICIAL, discutindo seus efeitos intrínsecos, bem como seu alcance e sua eficácia. A “qualificação”, portanto, não tem o sentido de poder revisor, capaz de limitar ou discutir os termos e os efeitos do mandado.

A ORDEM judicial deve ser cumprida, pois somente comporta questionamento no processo, pela via recursal. A supremacia da jurisdição, consagrada como princípio maior pela Carta Constitucional, exige respeito incondicional e ilimitado aos comandos dessa natureza, e procedimento de qualificação registral não pode inibir ou impedir o cumprimento EXATO de ordem jurisdicional.

A qualificação registral em verdade, tem o propósito de obstar a produção de efeitos impróprios, não direcionados pelo comando ou pretendidos pelo próprio juízo.

A este respeito é relevante destacar que todo e qualquer comando ou ordem judicial valem dentro dos limites intrínsecos de atuação do PROCESSO JUDICIAL, atingindo as PARTES, que são os postulantes (autores) e todos os demais envolvidos (réus citados pessoalmente ou de forma ficta).

O processo é por natureza público, mas a publicização processual não gera vínculos de obrigação para terceiros não envolvidos na relação processual.

O registro do mandado é capaz de produzir uma expansão EFICACIAL, de forma que a ordem passa a irradiar efeitos sobre a esfera de direitos e de interesses de terceiros.

A qualificação atua justamente neste momento e neste campo de elevação eficacial. Atua, o Oficial Registrador, na tutela dos interesses e direitos de todos aqueles não alcançados pela AÇÃO JUDICIAL (não integrantes da LIDE), que porventura venham experimentar certa redução ou desfalque de seus direitos patrimoniais em face do pretendido registro.

Ninguém pode ser obrigado ou condenado sem ser parte em processo judicial, e qualquer ordem desta natureza se mostra impositiva apenas para os integrantes da LIDE. Os efeitos que vierem extravasar o âmbito do direito das partes processuais, passa a fazer parte integrante do que denominamos de EFEITOS IMPRÓPRIOS, que podem e devem ser examinados pelo Serviço Registral. É neste percurso que o Oficial examina a corrente filiatória exigindo o cumprimento do princípio da continuidade, bem como os princípios da especialidade, subjetiva e objetiva.

No caso em pauta, o Oficial Registrador apenas visa preservar os interesses do INSS e da FAZENDA NACIONAL, que inscreveram penhoras anteriores, que por uma especial previsão, transformam o imóvel em bem INDISPONÍVEL. Portanto, lícita e correta a atuação do Registrador.

Superado este ponto, é de se ingressar na análise de fundo da questão
sub examine, que envolve matéria complexa e de difícil solução.

Na hipótese dos autos, o BEM IMÓVEL, como anotado, se encontra PENHORADO a favor da Autarquia Previdenciária e também a favor da Fazenda Nacional, sendo que por força de disposição legal expressa, o bem passa a ser considerado INDISPONÍVEL, o que, conforme entendimento jurisprudencial, o torna IMPENHORÁVEL, gravame que seria suficiente, no entender do REGISTRADOR, para impedir a arrecadação do bem pelo juízo FALIMENTAR.

Inicialmente é de se observar que os créditos possuem uma linha de preferência conferida pela legislação de regência. O próprio C.T.N., que é norma com eficácia de LEI COMPLEMENTAR, reconhece a prioridade dos CRÉDITOS TRABALHISTAS sobre os FISCAIS e, destes sobre os demais. Aos créditos quirografários resta disputa em igualdade de condições.

Contudo, a ordem de preferência somente se instaura frente a um CONCURSO DE CREDORES, que se viabiliza por duas formas básicas. A primeira, que é instaurada com a decretação da “quebra” do devedor, envolve o juízo universal da falência, formada a partir da atração de todos os credores e créditos para atuação na execução coletiva (vis attractiva ).

A segunda forma de CONCURSO DE CREDORES possui índole singular, sendo formada a partir da existência de mais de uma EXECUÇÃO JUDICIAL aforada em face de um mesmo devedor, desde que tenham gerado penhora sobre um mesmo bem imóvel ou móvel. Portanto, o CONCURSO DE CREDORES, nesta hipótese, depende da existência de mais de uma execução, aforada contra o mesmo DEVEDOR, que tenha determinada a penhora sobre um mesmo bem.

Neste caso, pouco importa quem tenha ingressado com a execução, natureza do crédito ou a forma de execução (judicial ou extrajudicial). O importante é a coincidência de devedor e do bem atingido pela constrição.

Nestes casos, se instaura a concorrência entre os credores, que podem levar o bem para o PRACEAMENTO e ARREMATAÇÃO, independentemente da cronologia ou da preferência de seus créditos.

Nesta forma de concorrência singular, determinada por execuções individuais e separadas, a ARREMATAÇÃO que primeiro se realiza, põe termo ao CONCURSO e o produto obtido com a venda judicial deve ser objeto de rateio. Por este motivo que se torna imprópria toda e qualquer forma de ADJUDICAÇÃO.

Portanto, na forma estabelecida pela legislação processual (Lei 10.440), após a arrematação, sobre o produto da venda, opera-se a sub-rogação da obrigação relativa ao cumprimento da ordem, em respeito à escala de PREFERÊNCIAS ou, em se tratando de créditos de igual sentido, à ordem cronológica (neste ponto o rateio se mostra diferente do que ocorre na FALÊNCIA, prestigiando em primeiro lugar o crédito quirografário que primeiro lavrou a penhora). O concurso a nível singular se encerra com a arrematação (ato processual).

Portanto, as preferências somente existem e operam efeitos enquanto houver o CONCURSO DE CREDORES, quer de índole SINGULAR, quer de natureza COLETIVA. Evidentemente que após a ARREMATAÇÃO válida, não há como se registrar uma nova penhora contra o devedor original, por maior preferência que o crédito ostente.

No caso em tela, temos dois créditos privilegiados garantidos por penhoras precedentes à quebra, registrados antes da realização da ARREMATAÇÃO. As duas penhoras determinaram a formação de um CONCURSO A NÍVEL SINGULAR. No entanto, a decretação da FALÊNCIA, antes de qualquer arrematação, transforma o concurso singular em CONCURSO COLETIVO, ficando submetido às suas regras e imposições. Destarte, a falência do devedor tem o condão de atrair o bem para o âmbito da execução coletiva.

A questão é saber se a indisponibilidade pode obstar esta atração.

A resposta, em que pese o entendimento do E. Conselho Superior da Magistratura, é de ser dada de forma negativa. A indisponibilidade no presente caso, não pode impedir a realização da regra processual, não podendo inibir a instauração do CONCURSO COLETIVO, que se pauta pelo princípio da igualdade no tratamento processual.

A indisponibilidade, evidentemente, não produz, por vias transversas, qualquer novo tipo de PREFERÊNCIA ou PRIORIDADE, mas apenas impede a alienação do bem pelo devedor. Trata-se de uma garantia para a execução e não uma prerrogativa adicional para o CRÉDITO.

Não há coerência ou isonomia em se entender de forma diversa, impedindo que os créditos participem, com suas prioridades ínsitas, do rateio.

Marcante é o fato de que a penhora pelo INSS não obstou o registro da penhora a favor da FAZENDA NACIONAL. Qual a diferença? Se o bem se tornou indisponível com a primeira penhora, como se poderia registrar a segunda penhora, em face do art. 53, § 1°, da Lei 8.212/91?

Evidente que não poderia ser determinada segunda penhora, caso houvesse a aplicação LITERAL do art. 53 da Lei Federal destacada. A prática e a sensibilidade registral temperando uma regra impositiva.

Mas é certo que a penhora a favor do INSS não pode obstar a penhora subseqüente a favor da FAZENDA NACIONAL. Pensar ou se posicionar em sentido contrário seria uma flagrante inversão da ordem de PREFERÊNCIA, e uma afronta à idéia de CONCURSO DE CRÉDITOS.

A nova lei sobre “recuperação judicial”, renova a necessidade do respeito ao CONCURSO DE CRÉDITOS, ao estabelecer uma nova ordem de preferência em seu art. 83, priorizando (1) os créditos trabalhistas até certo valor, depois (2) os créditos com garantia real e em terceiro lugar (3) os créditos FISCAIS. Esta ordem se tornaria totalmente desautorizada se fosse lido que a INDISPONIBILIDADE dos créditos a favor da FAZENDA NACIONAL impede a arrecadação para que o BEM IMÓVEL responda pela liquidação de outros créditos de privilégio superior.

A indisponibilidade, como tem proclamado alhures o E. Superior Tribunal de Justiça, independentemente de sua natureza (judicial ou administrativa, constritiva ou cautelar), não pode obstar o registro de penhora subseqüente enquanto estiver em formação o CONCURSO DE CREDORES.

Assim, da mesma forma que o crédito trabalhista conquistaria ingresso, também a arrecadação falimentar não pode ser obstada, para que o devido RATEIO seja feito frente ao juízo universal, possibilitando que o crédito fiscal e previdenciário venham eventualmente concorrer com outros de igual natureza.

Esta é a coerência que se deve extrair das normas que concebem os concursos de credores.

A jurisprudência, de forma precipitada, entende que a indisponibilidade gera a impenhorabilidade, não fazendo a devida depuração que o tema provoca, não só em função da necessidade de CONCURSOS DE CREDORES, mas por fatores diversos.

Em primeiro lugar, existem várias espécies de INDISPONIBILIDADE. Como se sabe, existe a indisponibilidade ADMINISTRATIVA e a JUDICIAL. A mesma terminologia marcando institutos diferentes.

Existe ainda a indisponibilidade de índole cautelar, por valor incerto, e a indisponibilidade determinada sobre valor certo e determinado. Da mesma forma, são institutos diversos com o mesmo RÓTULO.

Entretanto, em que pese a diversidade de institutos, a terminologia tem conduzido nossos Tribunais a procederam sempre à mesma interpretação, entendendo, em todos os casos, que a indisponibilidade induz a impenhorabilidade.

Este posicionamento que despreza os efeitos, que despreza a utilidade, que desconsidera os PRINCÍPIOS, exige uma certa reflexão, necessária para que na prática não tenhamos injustiças que as leis não poderiam determinar.

A impenhorabilidade, ademais, não gera efeitos positivos, mas apenas efeitos negativos, e tal perspectiva eficacial deve ser pensada e sopesada com muito cuidado e prudência, pois a regra do sistema jurídico se forma a partir de EFEITOS POSITIVOS e não negativos que somente são admitidos por exceção, pois não geram direitos, mas apenas restrições para terceiros.

Portanto, uma plêiade de efeitos e de razões concorrem para que o art. 53, da lei 8.212/91, não seja lido em sua singela literalidade gramática.

II. – NORMATIZAÇÃO:

Para que este feito venha aperfeiçoar a organização deste complexo procedimento “concursal”, os OFICIAIS DAS SERVENTIAS PREDIAIS, doravante, deverão OFICIAR ao juízo responsável pela penhora antecedente, sobre o registro das penhoras subseqüentes.

Esta determinação é feita em caráter NORMATIVO, para que o concurso de credores se instaure de forma mais própria e transparente.

Encaminhe-se cópia desta às Serventias da Capital, mesmo antes do trânsito em julgado, pois se trata apenas de um sistema de controle.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE. Expeça-se mandado para o registro. Cumpra-se o disposto no art. 203 da Lei de Registros Públicos.

P.R.I.C.

Venício Antonio de Paula Salles.

*Sérgio Jacomino é Presidente do Irib, registrador de imóveis na Capital de São Paulo e doutor em direito (Unesp).

ARRECADAÇÃO FALIMENTAR – AVERBAÇÃO E NÃO REGISTRO

Só devem ser registrados os títulos relacionados pela lei, entre os quais não está incluída a arrecadação de bem em processo falimentar. A ampliação da relação estabelecida em lei, constituiria burla ao princípio da taxatividade ou da tipicidade legal. Nada impede, porém, o acesso do título através de ato averbatório, em face do preceito contido no art. 246, da Lei n 6015/73.

CSMSP > APELAÇÃO CÍVEL: 11.150-0/0 LOCALIDADE: São José do Rio Preto 
DATA JULGAMENTO: 28/05/1990 DATA DJ: 06/07/1990 
Relator: Onei Raphael íntegra:

APELAÇÃO CÍVEL N.º 11.150-0/0 – SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

Excelentíssimo Desembargador Corregedor Geral da Justiça:

O Doutor Curador de Registros Públicos da Comarca de São José do Rio Preto insurge-se contra r. sentença de fls. 28/29, prolatada pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente do Primeiro Cartório de Registro de Imóveis, que determinou registro de ato de arrecadação efetivado em procedimento de natureza falimentar. Em suas razões, alega que a arrecadação de bem imóvel de falido não se encontra no rol do inciso I, do artigo 167, da Lei de Registros Públicos, que é taxativa, citando, para tanto, lições de SERPA LOPES e AFRÂNIO DE CARVALHO, socorrendo-se, ainda, de jurisprudência do Colendo Conselho Superior da Magistratura (fls. 32/36).

O recurso foi processado e determinou-se manifestação do Oficial, sustentando o mesmo a impossibilidade de ofertar contra-razões (fls. 39/40).

O Dr. Procurador de Justiça, por derradeiro, citando lições de VALMIR PONTES, WALTER CENEVIVA, WILSON DE SOUZA CAMPOS BATALHA, JOÃO RABELLO DE AGUIAR VALLIM, sustentou que a especificação dos atos sujeitos ao Registro Imobiliário não é exaustiva, e sim exemplificativa, merecendo a arrecadação acesso ao sistema porque, além de semelhante com a penhora, “modifica direito” (fls. 46/48).

É o resumo do essencial.

Opino.

1 – O registrador não tem legitimidade para oferecer contra-razões ao recurso interposto da sentença. Não é ele parte, nem tem interesse próprio na dúvida (cf. apelações cíveis ns. 5.125-0, 6.508-0 e 6.673-0, relator o Desembargador SYLVIO DO AMARAL). Bem por isso correta a recusa do Oficial em se manifestar sobre o mérito recursal (fls. 39/40).

2 – Consoante se depreende dos autos, o Meritíssimo Juiz de Direito da Quinta Vara Cível da Comarca de São José do Rio Preto decretou a quebra da firma individual VALDEI CAVALCANTE e, visando dar publicidade e “garantir os credores da empresa falida” (fls. 11), determinou registro da arrecadação do apartamento n. 126, do Edifício Redentora, sito a rua Penita n. 2.800, matriculado no Primeiro Cartório de Registro de Imóveis de São José do Rio Preto sob n. 27.403.

O r. mandado judicial, extraído do procedimento falimentar (processo n. 433/87), foi recusado pelo Serventuário, mas, diante da insistência do M.M. Juiz do processo, houve por bem aquele em suscitar dúvida, invocando, para tanto, o princípio da taxatividade ou tipicidade legal.

O Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente, porém, perfilhou entendimento contrário e determinou registro do título judicial (fls. 28/29), contra a qual se volta o Ilustre Representante do Ministério Público.

2.1 – O elenco das hipóteses de registro, com o devido respeito ao posicionamento do Douto Julgador e do Ilustre Procurador da Justiça, é “numerus clausus”, ou seja, taxativo, significando que os atos e fatos inscritíveis são apenas aqueles previstos em lei.

Além da conhecida lição de AFRÂNIO DE CARVALHO (cf. “Registro de Imóveis”, pág. 76), bem fixou a compreensão do assunto e eminente Juiz NARCISO ORLANDI NETO, então Juiz de Direito da Primeira Vara de Registros Públicos e hoje honrando o Egrégio Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo: “A taxatividade do rol de atos registráveis, tantas vezes sustentada por este Juízo e pelo E. Conselho Superior da Magistratura, não decorre de posições pessoais ou de forma especial de interpretar a lei. Os direitos reais são os enumerados no artigo 674 do Código Civil e alguns poucos previstos em leis posteriores. Somente a lei pode criar direitos reais. Por outro lado, o artigo 676 do mesmo Código Civil determina que a aquisição dos direitos reais se dá com a transcrição ou inscrição do título no Registro de Imóveis. E este o princípio da inscrição, referido pela doutrina” (LISIPO GARCIA, “A Transcrição”, Livraria Francisco Alves, 1922, p. 145). O Registro de Imóveis destina-se, então, a recolher, os títulos de aquisição de direitos reais. Esta é sua finalidade, precípua, ainda que outros atos tenham sido atraídos posteriormente, com finalidade diversa (as anotações preventivas, a locação, as incorporações e os loteamentos), mas sempre com previsão legal” (cf. sentença proferida no processo n. 993/82).

Não cabe ao Juiz ou a qualquer outro interessado ampliar o rol dos atos inscritíveis no sistema registrário.

2.2 – Especificamente ao registro ou averbação da arrecadação de bem imóvel feita em procedimento falimentar, inexiste manifestação recente do Egrégio Conselho Superior da Magistratura, mas, perante a Primeira Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital, vários são os posicionamentos.

No processo n. 3.253/72, quando em vigor a antiga Lei de Registros Públicos, o Ilustre Juiz GILBERTO VALENTE DA SILVA determinou o registro da arrecadação, sob argumento de que “seu efeito é simplesmente o de constituir em estado de má fé o terceiro adquirente que transcreveu ou inscreveu o seu direito após a inscrição”, invocando, ademais, o artigo 883 do Código Civil e o artigo 895 do Código de Processo Civil.

Posteriormente, os Notáveis Magistrados NARCISO ORLANDI NETO e JOSÉ RENATO NALINI perfilharam entendimento diverso, no sentido de que a arrecadação não está incluída no rol do artigo 167, da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e não altera, subjetiva ou objetivamente, a situação do imóvel, nem se constitui em título para nascimento, modificação ou extinção de direito real, denegando, em conseqüência, possibilidade de registro ou averbação (cf. processos ns. 361/83 e 743/84).

Mais recentemente, o Eminente Juiz MAURÍCIO RODRIGUES MARQUES determinou o registro de arrecadação de imóvel em processo falimentar sob argumento de que o ato constritivo se equipara à penhora, aplicando-se, por analogia, o artigo 167, II, n. 5, da Lei 6.015, de 1973 (processo n. 332/89).

2.3 – A arrecadação de bem imóvel da massa falida não está incluída na relação exaustiva do artigo 167 da Lei de Registros Públicos, nem há previsão específica de registro na lei falimentar. Bem por isso inviável seu acesso por simples determinação do Juiz.

O sistema formal e rigoroso, como o registrário, de outro modo, não se compadece com interpretações ampliativas, equiparando-se a penhora com a arrecadação. São inegáveis suas semelhanças, eis que, tanto na execução singular, como na coletiva, submete-se o bem constrito do devedor ao poder do Estado para garantia e satisfação de obrigações assumidas perante os credores. Mas, à evidência, constituem-se institutos jurídicos diversos e inconfundíveis. Por razões que não cabe discutir, o legislador não incluiu a arrecadação de bem em processo falimentar como ato registrável, e admitir-se ampliação disfarçada da relação estabelecida em lei constituiria burla ao princípio da taxatividade ou da tipicidade legal.

2.4 – Nada impede, porém, o acesso do título através de ato averbatório, em face do preceito contido no artigo 246 da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973.

É verdade que a arrecadação não muda a situação jurídico-real do patrimônio, que ainda permanece sob domínio do falido, o qual, de conformidade com lição do pranteado PONTES DE MIRANDA, “não perde, totalmente, o poder de dispor. Só o perde relativamente à finalidade da constrição executiva” (cf. “Tratado de Direito Privado”, tomo 28/162). Não se gera, assim, indisponibilidade, nem subtração do patrimônio do devedor, mas apenas satisfação do direito dos credores.

No entanto, não se pode negar a ocorrência de fato relevante, a teor do artigo 246 da Lei de Registros Públicos, eis que uma das finalidades essenciais do registro é assegurar a validade e a normalidade dos negócios imobiliários.

O artigo 39 da Lei de Falência estabelece que a quebra “compreende todos os bens do falido”, acrescentando, no artigo seguinte, que “desde o momento da abertura da falência, ou da decretação do seqüestro, o devedor perde o direito de administrar os seus bens e dele dispor”, expressando, por derradeiro, no parágrafo único do artigo citado que “não pode o devedor, desde aquele momento, praticar qualquer ato que se refira direta ou indiretamente aos bens, interesses, direitos e obrigações compreendidas na falência, sob pena de nulidade, que o juiz pronunciará de ofício, independente de prova de prejuízo”.

Em se retirando do proprietário uma das faculdades inerentes ao domínio, ou seja, o poder de disposição do bem, é inegável a ocorrência de mutação relevante. Esta, por sinal, a razão do registro da penhora, que tem por escopo a garantia registral da apreensão e sua publicidade, importantes para o mundo jurídico e negocial.

A averbação é ato acessório, tanto em relação à forma, quanto a sua substância, em face dos efeitos que deve produzir. E, no caso específico, é inegável a mutação objetiva para assegurar validade e legalidade de eventuais transações. Ao contrário do protesto contra alienação de bens, que, por se cuidar de medida cautelar e provisória, não altera o registro, nem impede efetiva negociação do imóvel, criando, em conseqüência, insegurança e embaraço nas negociações legítimas, a arrecadação de bem imóvel, decorrente de quebra de pessoa que figure como proprietária, deve ser admitida no sistema registrário, a fim de que qualquer pessoa, porventura interessada em adquirir o bem ou de recebê-lo em garantia real, tenha notícia de que ele está sujeito à execução coletiva.

Há causa legítima para se determinar a averbação.

3 – Assim, o parecer que ora submeto é no sentido de se dar provimento ao recurso para, em conseqüência, julgar procedente a dúvida, mantendo-se a recusa em registrar o título judicial. O Serventuário, porém, deverá aceitá-lo mediante ato averbatório.

Ao elevado discernimento de Vossa Excelência.

São Paulo, 25 de abril de 1990.

(a) KIOITSI CHICUTA, Juiz Auxiliar da Corregedoria

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N.º 11.150-0/0, da Comarca de SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, em que é apelante o PROMOTOR DE JUSTIÇA CURADOR DE REGISTROS PÚBLICOS, apelado o JUÍZO DE DIREITO CORREGEDOR PERMANENTE e interessado GUMERCINDO DE SETA.

A C O R D A M os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, dar provimento ao recurso.

O Sr. Oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis de São José do Rio Preto recebeu, para registro, mandado de registro de arrecadação falimentar, arrecadação oriunda de processo falimentar da firma individual de Valdel Cavalcante que tramitou pela 5ª Vara Cível daquela Comarca.

Ato contínuo, suscitou dúvida, entendendo que o art. 167, inciso II, n. 5, da Lei dos Registros Públicos, não prevê a hipótese.

O M.M. Juiz Corregedor Permanente, às fls. 28/29, rejeitou a dúvida para determinar o registro do referido auto de arrecadação.

Dessa decisão recorreu o Dr. Curador dos Registros Públicos, às fls. 31/36, objetivando o provimento do recurso e a reforma da r. sentença do Juiz de primeiro grau, que determinou o registro do mandado, cancelando-se esse mesmo registro se já consumado.

Nesta instância, o Dr. Procurador de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

O Dr. Juiz Auxiliar desta Corregedoria, no parecer de fls. 51/58, opinou pelo provimento do recurso, julgando-se, em conseqüência, procedente a dúvida e mantendo-se a recusa em registrar o título judicial. O Serventuário, porém, deverá aceitá-lo mediante ato averbatório.

É o relatório.

O M.M. Juiz Corregedor Permanente do Primeiro Cartório de Registro de Imóveis julgou improcedente a dúvida, determinando registro do mandado de registro de arrecadação de bem imóvel feita em procedimento falimentar, sob argumento de que a relação do artigo 167 da Lei de Registros Públicos exemplificativa e que interessa a publicidade do ato.

O posicionamento do Ilustre Juiz, embora respeitável, contraria jurisprudência pacífica do Egrégio Conselho Superior da Magistratura em se considerar que só devem ser registrados os títulos relacionados pela lei.

Mas, dada a relevância do ato praticado na esfera jurisdicional, que limita a disponibilidade do bem imóvel arrecadado, convém ao sistema registrário, admiti-lo mediante ato averbatório. O registro visa, dentre outras finalidades, assegurar a validade e a normalidade dos negócios jurídicos, sendo de cautela dar publicidade do ato constritivo e dar a este garantia registral da apreensão (art. 167, II, n.º 12, Lei n.º 6.015/73).

Assim e nos termos do bem lançado parecer do Dr. Juiz de Direito Auxiliar desta Corregedoria, Kioitsi Chicuta, o recurso deve ser acolhido, reformando-se a r. sentença para julgar procedente a dúvida, denegando-se o registro do título. Este, porém, deverá ser averbado.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores ANICETO LOPES ALIENDE, Presidente do Tribunal de Justiça e ODYR JOSÉ PINTO PORTO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 28 de maio de 1990.

(a) ONEI RAPHAEL, Corregedor Geral da Justiça e Relator

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