Alteração de Regime de Bens em União Estável

Em 06/05/2024, compareceu nesta serventia o senhor Fulano para solicitar uma escritura de união estável;

No pedido, informou que gostaria que fosse lavrado uma escritura de união estável, entre ele e sua companheira, a senhora Beltrana, informando que a data do início do relacionamento era de 20/01/2020 e o regime que eles pretendiam convencionar era o da separação de bens;

Hoje, o senhor Fulano comparece nestas notas para solicitar a dissolução da referida união, informando que o motivo da dissolução é que ele e sua companheira, pretendem alterar o regime estabelecido no ato lavrado em 06/05/2024, e que, após lavrar a escritura de dissolução, pretende imediatamente lavrar uma nova escritura de união estável, convencionando o regime patrimonial da comunhão universal;

Diante desta informação, sabendo que para alterar o regime estabelecido, a forma correta é através de uma ação judicial e face ao disposto no artigo 1639 do Código Civil recusei a lavrar o ato notarial solicitado.

O Código Civil de 1916 impunha a imutabilidade e o atual admite a mudança porém por meio de decisão judicial.

Agi corretamente?.

Resposta:

  1. É possível alterar o regime de bens de uma união estável de forma extrajudicial, ou seja, sem a necessidade de recorrer à Justiça. Essa mudança pode ser feita diretamente no cartório onde a união estável está registrada, mediante o comparecimento dos companheiros.
  2. Porém deverá ser observado o seguinte:

É fundamental que a união estável esteja devidamente registrada no cartório de registro civil das pessoas naturais.

O comparecimento dos Companheiros.

Ambos os companheiros devem comparecer ao cartório, pessoalmente ou por meio de procuração pública específica e atualizada.

Requerimento e Documentos.

Documentos pessoais dos companheiros (RG, CPF, comprovante de residência).

Termo de reconhecimento da união estável.

Documentos que comprovem a necessidade da alteração do regime de bens (se houver).

Procuração pública (se um dos companheiros não puder comparecer pessoalmente).

É necessário solicitar a alteração do regime de bens no cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e apresentar os documentos necessários, como a documentação pessoal dos companheiros e o termo de reconhecimento da união estável.

  1. Para a alteração no Registro Civil das Pessoas Naturais o registrador do cartório irá registrar a alteração do regime de bens no livro de registro civil da união estável.
  2. A alteração do regime de bens na união estável é regulamentada pelo Provimento nº 141 do CNJ. Artigos 9º-A e 9º-B.

A mudança de regime de bens tem efeito ex nunc, ou seja, só produz efeitos para o futuro, respeitando os direitos de terceiros e as situações jurídicas já existentes.

A alteração do regime de bens não impede a transferência dos bens já adquiridos, desde que seja garantida a preservação dos direitos de terceiros.

  1. A averbação da alteração patrimonial exige, além do requerimento conjunto, a existência do registro da união estável no Livro E do Registro Civil das Pessoas Naturais, em que os companheiros têm residência.
  2. o art. 94-A da Lei de Registros Públicos e o art. 1º, § 3º, do Provimento n. 37 do CNJ só admitem, como registráveis, o que denominamos como títulos qualificados. São eles a escritura pública, o termo declaratório perante o Registro Civil das Pessoas Naturais e a decisão judicial, visto que são os títulos que ostentam elevada confiabilidade, por conta de a sua confecção envolver a intervenção de um agente público com fé pública. Portanto, um contrato de convivência por instrumento particular não é apto a ingressar na tábua registral.

Entretanto, para alterar o regime de bens no registro público, os arts. 9º-A e 9º-B do Provimento n. 37 do CNJ, satisfizeram-se com um requerimento pessoal dos companheiros perante o Registro Civil das Pessoas Naturais, com as devidas certidões. Alerte-se que o requerimento tem de ser apresentado pessoalmente pelos companheiros ao Registro Civil, admitida a representação destes por procurador munido de procuração por instrumento público. O motivo desse formalismo é evitar alterações fraudulentas de bens, sendo essencial que a vontade de ambos os companheiros seja explícita perante o Registro Civil no sentido da modificação do regime de bens aplicável à sua convivência.

  1. Se a União Estável estiver devidamente registrada no cartório, basta o casal ir até o cartório e realizar a alteração do Regime de Bens. Essa alteração do regime no curso da União Estável é orientada pelo Provimento nº 37 do Conselho Nacional de Justiça e complementado pelo Provimento nº 141 em 2023.

Nada impede, porém, que o usuário lavre uma escritura pública perante o Tabelião de Notas, ou um termo declaratório perante o Registro Civil para alterar o regime de bens. Esse título de alteração, todavia, não será apto para, por si só, averbação no registro de união estável no Registro Civil, tendo apenas eficácia inter partes. Isso porque o art. 9º-A do Provimento n. 37 do CNJ condiciona a averbação da alteração do regime de bens à declaração expressa dos companheiros perante o Registro Civil de modo presencial, ou por meio de mandatário com instrumento público, além da apresentação das certidões do art. 9º-B da mesma norma administrativa.

  1. Cabe, ainda, realçar que, além das certidões, o requerimento de alteração do regime de bens precisa estar acompanhado de um posicionamento expresso acerca de eventual partilha de bens (art. 9º-B, inc. V, do Provimento n. 37 do CNJ).4 Se, por exemplo, o casal quer mudar do regime da comunhão universal de bens para o da separação convencional, é forçoso que eles acenem para o modo e o momento em que serão partilhados os bens comuns. Advirta-se, contudo, que não há obrigatoriedade de partilha nesse momento, podendo ela ser deixada para a futura dissolução da união estável, fato que deverá ser noticiado no requerimento de alteração da união estável.
  2. Caso, porém, os companheiros decidam partilhar os bens, será obrigatória a participação de advogado. Surgem, então, as seguintes dúvidas: essa partilha de bens poderá ser formalizada no próprio requerimento de alteração do regime de bens ou em um instrumento particular anexo? Ou terá ela de ser formalizada por meio de escritura pública ou de termo declaratório por aplicação analógica do que se dá com a partilha de bens quando da dissolução da união estável à luz do art. 1º, § 6º, do Provimento n. 37 do CNJ?6

Entendemos que a partilha de bens em razão da mudança de regime de bens é ato jurídico que depende das mesmas formalidades exigidas para a partilha decorrente da dissolução da união estável, porque ubi eadem ratio ibi eadem jus, ou seja, onde há a mesma razão, há a mesma regra.

Além disso, o ato de partilha de bens envolve situações jurídicas complexas, como os cuidados em aferir se são ou não devidos impostos de transmissão no caso de partilha desigual, bem como os deveres de comunicação de eventuais transmissões imobiliárias por meio da emissão da DOI (Declaração de Operação Imobiliária). Ademais, há a necessidade de existir um título específico com a partilha de bens, a fim de viabilizar a formalização das transferências de propriedade no Cartório de Registros Imóveis, nos órgãos de trânsito ou em outras instâncias.

Como se vê, a partilha de bens não pode ser resumida a um mero “anexo” de um requerimento de alteração de regime de bens de união estável, sob pena de comprometer a segurança jurídica exigida para um ato de tamanha complexidade. Por essa razão, entendemos que a partilha de bens por ocasião da alteração de regime de bens depende de sua formalização por título qualificado – escritura pública, termo declaratório ou decisão judicial -, e com assistência de advogado.

  1. Portanto as escrituras de dissolução da união estável  e outra escritura de união estável convencionando o regime da comunhão de bens, consequentemente alterando o regime de bens  não poderia ser realizada, pois o que se pretende é alterar  o regime de bens em uma escritura lavrada em 06-05-2.024 retroativa a 20-01-2.020 de união estável pelo regime da separação de bens (absoluta) pela escritura de dissolução da união estável  lavrando em seguida outra escritura de união estável convencionando o regime da comunhão universal de bens também com data retroativa
  2. Entretanto, a definição do regime de bens em uma união estável, por meio de contrato ou escritura pública, não produz efeitos retroativos, ou seja, não afeta bens adquiridos antes da data da celebração do contrato. A exceção é o regime da comunhão parcial de bens, que pode ter efeitos retroativos à data do início da união estável, desde que expressamente previsto no contrato.

É possível reconhecer uma união estável com data retroativa, mas existem ressalvas importantes. A principal é que, em regra, a escritura pública de união estável só produz efeitos a partir da sua assinatura ou registro em cartório, não sendo possível retroagir a sua vigência. No entanto, é possível, em alguns casos, reconhecer a união estável com data anterior à assinatura da escritura, desde que o casal tenha estabelecido um regime de bens de comunhão parcial que não é o caso.

Desta forma correta é que a alteração seja feita pelas vias judiciais nos termos do artigo 1639, § 2º do CC mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Sub censura .

São Paulo, 08 de Junho de 2.025.

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